CAPÍTULO
O POLÍTICO
Câmeras a postos, a equipe toma as ruas. Os gritos de “bafafá e agonia” chegam antes do repórter, que caminha com um olhar atento e um sorriso no rosto, conversa com os moradores, arranca respostas com facilidade. A cada dez segundos, alguém passa falando: “e aí, Jorge!”, “bora, Jorge!” ou simplesmente replicando seu característico brado de “aê”. O que parece uma descrição da rotina de repórter de Jorge Araújo é, na verdade, mais um dia da sua campanha eleitoral nas ruas de Salvador.
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Poucas pessoas naquela manhã de campanha, em 2 de outubro de 2024, passaram por Jorge Araújo sem olhar duas vezes. Afinal, era a figura que viam nas TVs, ali, em carne, osso e santinhos, que estampavam o número 11.111 e o nome que apareceria na urna: “Jorge Araújo Repórter”. Entre agosto e outubro, esse foi o cenário padrão na vida do jornalista, que levou sua caravana eleitoral para as ruas da Barra a Pau da Lima.
A popularidade conquistada através das telas ficou evidente nas urnas: na eleição municipal de 2024, Jorge Araújo foi o vereador mais votado de Salvador, com 36.065 votos. Foi a segunda maior votação da história da capital baiana, atrás apenas de Eliana Kertész, escolhida por 94.685 eleitores em 1982. O repórter, que já passou por emissoras como a TV Aratu e TV Record, além da Band Bahia, onde trabalha atualmente, foi candidato pelo Partido Progressistas (PP), uma das siglas da base do prefeito reeleito, Bruno Reis (UNIÃO).
Jorge afirma que entrar no mundo da política não era um plano que tinha para a própria carreira, mas “foi acontecendo”. E vem acontecendo há muitos anos, desde que trabalhava com campanhas políticas em Tucano, no nordeste do estado. Repetir as promessas dos candidatos aguçou seu olhar para o outro lado, o das pessoas cujas necessidades nunca eram realmente atendidas.
"Eu comecei a me revoltar com isso e entender que o microfone tem esse poder de comunicar com as pessoas e também de comunicar com os órgãos, para dizer que essas pessoas existem, pagam impostos e precisam ter atenção. (...) E a comunicação tem o poder de resolver isso. Um telefonema de uma emissora de televisão ou de rádio resolve mesmo. Nós somos um poder, temos essa credibilidade. Mas precisamos invadir a política e ter também o poder da caneta, da decisão”, defende.
Essa não é a primeira vez que ele tenta emplacar uma carreira política. Em 2022, se candidatou ao cargo de deputado federal. Na ocasião, conseguiu 32 mil votos, que não foram suficientes para que tomasse posse. Este ano, ganhou com vantagem: uma diferença de 12 mil votos em relação ao segundo vereador mais bem votado, Carlos Muniz (PSDB), presidente da Câmara Municipal de Salvador. No dia 14 de novembro, anunciou nas redes sociais sua pré-candidatura a deputado federal, em vídeo ao lado do ex-prefeito de Salvador ACM Neto (União Brasil) e de Ciro Nogueira, senador e presidente do PP Ciro Nogueira.
Jorge Araújo está longe de ser o único profissional da notícia a tentar converter o trabalho na comunicação em votos nas urnas. Em toda a Bahia, ao menos 144 comunicadores, entre jornalistas e radialistas, tentaram uma cadeira nas câmaras municipais em 2024, o equivalente a 0,4% dos 35.201 pedidos de candidatura para prefeito ou vereador no estado, de acordo com estatísticas do Tribunal Superior Eleitoral (TSE). A maioria dos jornalistas baianos participantes entrou no pleito pela vereança, com exceção de Josi da Rádio, candidata do PSB à prefeitura de Coração de Maria, no interior do estado.
O número pode ser ainda maior, visto que alguns profissionais, como o próprio Jorge Araújo, não têm sua ocupação registrada no site do TSE. Segundo ele, o motivo de não ter colocado “jornalista” como profissão é o fato de ser formado como radialista, apesar de exercer a função de repórter televisivo.
Câmeras a postos, a equipe toma as ruas. Os gritos de “bafafá e agonia” chegam antes do repórter, que caminha com um olhar atento e um sorriso no rosto, conversa com os moradores, arranca respostas com facilidade. A cada dez segundos, alguém passa falando: “e aí, Jorge!”, “bora, Jorge!” ou simplesmente replicando seu característico brado de “aê”. O que parece uma descrição da rotina de repórter de Jorge Araújo é, na verdade, mais um dia da sua campanha eleitoral nas ruas de Salvador.
Poucas pessoas naquela manhã de campanha, em 2 de outubro de 2024, passaram por Jorge Araújo sem olhar duas vezes. Afinal, era a figura que viam nas TVs, ali, em carne, osso e santinhos, que estampavam o número 11.111 e o nome que apareceria na urna: “Jorge Araújo Repórter”. Entre agosto e outubro, esse foi o cenário padrão na vida do jornalista, que levou sua caravana eleitoral para as ruas da Barra a Pau da Lima.
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A popularidade conquistada através das telas ficou evidente nas urnas: na eleição municipal de 2024, Jorge Araújo foi o vereador mais votado de Salvador, com 36.065 votos. Foi a segunda maior votação da história da capital baiana, atrás apenas de Eliana Kertész, escolhida por 94.685 eleitores em 1982. O repórter, que já passou por emissoras como a TV Aratu e TV Record, além da Band Bahia, onde trabalha atualmente, foi candidato pelo Partido Progressistas (PP), uma das siglas da base do prefeito reeleito, Bruno Reis (UNIÃO).
Jorge afirma que entrar no mundo da política não era um plano que tinha para a própria carreira, mas “foi acontecendo”. E vem acontecendo há muitos anos, desde que trabalhava com campanhas políticas em Tucano, no nordeste do estado. Repetir as promessas dos candidatos aguçou seu olhar para o outro lado, o das pessoas cujas necessidades nunca eram realmente atendidas.
"Eu comecei a me revoltar com isso e entender que o microfone tem esse poder de comunicar com as pessoas e também de comunicar com os órgãos, para dizer que essas pessoas existem, pagam impostos e precisam ter atenção. (...) E a comunicação tem o poder de resolver isso. Um telefonema de uma emissora de televisão ou de rádio resolve mesmo. Nós somos um poder, temos essa credibilidade. Mas precisamos invadir a política e ter também o poder da caneta, da decisão”, defende.
Essa não é a primeira vez que ele tenta emplacar uma carreira política. Em 2022, se candidatou ao cargo de deputado federal. Na ocasião, conseguiu 32 mil votos, que não foram suficientes para que tomasse posse. Este ano, ganhou com vantagem: uma diferença de 12 mil votos em relação ao segundo vereador mais bem votado, Carlos Muniz (PSDB), presidente da Câmara Municipal de Salvador. No dia 14 de novembro, anunciou nas redes sociais sua pré-candidatura a deputado federal, em vídeo ao lado do ex-prefeito de Salvador ACM Neto (União Brasil) e de Ciro Nogueira, senador e presidente do PP Ciro Nogueira.
Jorge Araújo está longe de ser o único profissional da notícia a tentar converter o trabalho na comunicação em votos nas urnas. Em toda a Bahia, ao menos 144 comunicadores, entre jornalistas e radialistas, tentaram uma cadeira nas câmaras municipais em 2024, o equivalente a 0,4% dos 35.201 pedidos de candidatura para prefeito ou vereador no estado, de acordo com estatísticas do Tribunal Superior Eleitoral (TSE). A maioria dos jornalistas baianos participantes entrou no pleito pela vereança, com exceção de Josi da Rádio, candidata do PSB à prefeitura de Coração de Maria, no interior do estado.
O número pode ser ainda maior, visto que alguns profissionais, como o próprio Jorge Araújo, não têm sua ocupação registrada no site do TSE. Segundo ele, o motivo de não ter colocado “jornalista” como profissão é o fato de ser formado como radialista, apesar de exercer a função de repórter televisivo.
Audiência, um forte capital político
O jornalismo e a política são campos profundamente articulados entre si no Brasil. Essa relação é antiga e as áreas dialogam de formas variadas, seja no controle dos meios de comunicação por parlamentares ou através das candidaturas de apresentadores ou repórteres, que têm a rádio ou a TV como uma forma de catapultar seus nomes.
São diversos os exemplos de profissionais da notícia que usam programas televisivos como espaços para a elevação ao patamar de potenciais representantes eletivos ao longo da história. Em escala nacional, um dos maiores exemplos é o apresentador José Luiz Datena. Em nível local, também não é raro que isso aconteça: entre 1989 e 1993, o comunicador Fernando José foi prefeito de Salvador; três anos depois, Emmerson José, conhecido pela sua atuação na TV e na rádio, assumiu o cargo de vereador na capital baiana, no qual ficou por 12 anos (entre 1996 e 2008), e chegou a ser presidente da câmara por quatro anos. E atualmente, além de Jorge Araújo, a jornalista Cris Correia, que já trabalhou como repórter e apresentadora na TVE e na Band, também ocupa uma cadeira no Legislativo de Salvador – no caso dela, pelo segundo mandato.
Outro nome notável a tentar uma cadeira na Câmara Municipal foi Marcelo Castro, hoje apresentador do programa Alô Juca e acusado de liderar uma organização criminosa que desviava doações de telespectadores. Ele foi candidato em 2016 pelo PRB, usando na urna o nome “Repórter Marcelo Castro”. Com 2.828 votos, não conseguiu se eleger.
“[O jornalista] utiliza o espaço privilegiado que tem em concessões públicas de rádio e televisão, transformando esses espaços quase que em espaços privados para se constituir como uma espécie de liderança política. Ao mesmo tempo que reivindica um discurso do outsider, praticamente de uma figura antissistema, quer integrar o sistema. E para integrar o sistema utiliza-se do espaço privilegiado que tem. Ter uma audiência significativa é algo que já desequilibra na relação com outros candidatos, porque você já parte de um lugar de ser mais conhecido”, diz.
Segundo Melo, o elemento que favorece essa situação é justamente a ausência de uma regulação democrática do setor de comunicações e, quando jornalistas decidem entrar na política, há sempre dois perigos: o risco de cometerem excessos enquanto ainda são jornalistas – a exemplo dos programas policialescos e as violações de direitos humanos que vêm com isso – e o desses profissionais reforçarem a ideia da política como um espetáculo, “cada vez mediatizado e pouco preocupado com as questões que deve incidir para melhorar as condições de vida da população”.
“O jornalismo tem que ser um local de questionamento da política e dos políticos, de colocar os políticos no lugar de escrutínio junto à população. É aquilo que o Manuel Chaparro já falava do jornalismo ser a linguagem dos conflitos: ele precisa também confrontar a política. Mas, quando os jornalistas começam a olhar para a política como esse lugar sedutor, isto começa também a fragilizar a própria profissão”, afirma.
Para o jornalista, professor de Comunicação e doutor em Ciência Política Paulo Victor Melo, a imbricação entre os dois campos não é necessariamente algo prejudicial à democracia e pode muito bem ser positivo, uma vez que os meios de comunicação levam para as audiências aquilo que os políticos estão ou não fazendo. Mas, há também um aspecto que ele relaciona à fragilização da democracia: o uso dos meios de comunicação como trampolim político-eleitoral.
Paulo Victor Melo é professor de Ciências da Comunicação do IADE/Universidade Europeia – Faculdade de Design, Tecnologia e Comunicação, em Lisboa/Portugal. se debruça em pesquisas sobre tecnovigilância, relações raciais e políticas de comunicação. Faz parte do Conselho Diretor do Intervozes – Coletivo Brasil de Comunicação Social e é secretário da Associação Brasileira de Pesquisadores em Comunicação e Política (Compolítica)
Quer saber mais?
Levantamento do Intervozes mapeou os proprietários de mídia no Brasil – e muitos deles têm história na política. Veja aqui: Quem controla a mídia no Brasil?



Audiência, um forte
capital político
O jornalismo e a política são campos profundamente articulados entre si no Brasil. Essa relação é antiga e as áreas dialogam de formas variadas, seja no controle dos meios de comunicação por parlamentares ou através das candidaturas de apresentadores ou repórteres, que têm a rádio ou a TV como uma forma de catapultar seus nomes.
São diversos os exemplos de profissionais da notícia que usam programas televisivos como espaços para a elevação ao patamar de potenciais representantes eletivos ao longo da história. Em escala nacional, um dos maiores exemplos é o apresentador José Luiz Datena. Em nível local, também não é raro que isso aconteça: entre 1989 e 1993, o comunicador Fernando José foi prefeito de Salvador; três anos depois, Emmerson José, conhecido pela sua atuação na TV e na rádio, assumiu o cargo de vereador na capital baiana, no qual ficou por 12 anos (entre 1996 e 2008), e chegou a ser presidente da câmara por quatro anos. E atualmente, além de Jorge Araújo, a jornalista Cris Correia, que já trabalhou como repórter e apresentadora na TVE e na Band, também ocupa uma cadeira no Legislativo de Salvador – no caso dela, pelo segundo mandato.
Outro nome notável a tentar uma cadeira na Câmara Municipal foi Marcelo Castro, hoje apresentador do programa Alô Juca e acusado de liderar uma organização criminosa que desviava doações de telespectadores. Ele foi candidato em 2016 pelo PRB, usando na urna o nome “Repórter Marcelo Castro”. Com 2.828 votos, não conseguiu se eleger.
“[O jornalista] utiliza o espaço privilegiado que tem em concessões públicas de rádio e televisão, transformando esses espaços quase que em espaços privados para se constituir como uma espécie de liderança política. Ao mesmo tempo que reivindica um discurso do outsider, praticamente de uma figura antissistema, quer integrar o sistema. E para integrar o sistema utiliza-se do espaço privilegiado que tem. Ter uma audiência significativa é algo que já desequilibra na relação com outros candidatos, porque você já parte de um lugar de ser mais conhecido”, diz.
Segundo Melo, o elemento que favorece essa situação é justamente a ausência de uma regulação democrática do setor de comunicações e, quando jornalistas decidem entrar na política, há sempre dois perigos: o risco de cometerem excessos enquanto ainda são jornalistas – a exemplo dos programas policialescos e as violações de direitos humanos que vêm com isso – e o desses profissionais reforçarem a ideia da política como um espetáculo, “cada vez mediatizado e pouco preocupado com as questões que deve incidir para melhorar as condições de vida da população”.
“O jornalismo tem que ser um local de questionamento da política e dos políticos, de colocar os políticos no lugar de escrutínio junto à população. É aquilo que o Manuel Chaparro já falava do jornalismo ser a linguagem dos conflitos: ele precisa também confrontar a política. Mas, quando os jornalistas começam a olhar para a política como esse lugar sedutor, isto começa também a fragilizar a própria profissão”, afirma.
Para o jornalista, professor de Comunicação e doutor em Ciência Política Paulo Victor Melo, a imbricação entre os dois campos não é necessariamente algo prejudicial à democracia e pode muito bem ser positivo, uma vez que os meios de comunicação levam para as audiências aquilo que os políticos estão ou não fazendo. Mas, há também um aspecto que ele relaciona à fragilização da democracia: o uso dos meios de comunicação como trampolim político-eleitoral.
Paulo Victor Melo é professor de Ciências da Comunicação do IADE/Universidade Europeia – Faculdade de Design, Tecnologia e Comunicação, em Lisboa/Portugal. se debruça em pesquisas sobre tecnovigilância, relações raciais e políticas de comunicação. Faz parte do Conselho Diretor do Intervozes – Coletivo Brasil de Comunicação Social e é secretário da Associação Brasileira de Pesquisadores em Comunicação e Política (Compolítica)
“Não é tudo que Bruno [Reis, prefeito de Salvador] faz que eu digo amém. Existem algumas coisas que ele faz que eu não concordo. O que eu acho bacana é que eu consigo dividir as tarefas. Uma coisa é uma coisa e outra coisa é outra coisa, eu não costumo misturar. E não uso a comunicação para me favorecer politicamente”, afirma Araújo.
Do “Bafafá” à Câmara:
uma rotina dupla
As tardes de Jorge Araújo ganharam um novo compromisso na Câmara Municipal desde janeiro, mas, entre 12h50 e 13h15 de segunda a sexta-feira, o encontro ainda é na Band Bahia. Em novembro de 2024, estreou o programa Bafafá na Band, que hoje Jorge concilia com o mandato.
Em outubro de 2025, um ano após a primeira entrevista, nos encontramos novamente com Jorge Araújo. A conversa é rápida, entre um compromisso e outro do apresentador. Perguntado se existe algum tipo de choque com o partido quando faz ao vivo cobranças à prefeitura – uma vez que seu partido é da base do prefeito –, ele garante que não.
Não é proibido manter as duas profissões: a Constituição Federal estabelece que existe a possibilidade de um vereador assumir ou manter outro emprego, contanto que não haja conflito de horários e atividades. Na prática, porém, justamente por serem áreas que costumam se encontrar, pode haver rusgas entre as ocupações. É o que defende Paulo Victor Melo.
“Nós temos que entender que a comunicação extrapola as questões legais. É um campo com uma capacidade substancial de influenciar opiniões, de formar ideias, de moldar valores, de estimular comportamentos e práticas, que são os meios de comunicação. Claro que o componente do que é permitido ou não tem que ser avaliado, mas me parece extremamente prejudicial para o jornalismo e para a política e, portanto, para a democracia, que um parlamentar tenha um programa de rádio ou seja repórter de um programa. Porque isso prejudica tudo: a credibilidade da informação, a cobertura sobre o parlamento e o nível de aprofundamento da informação que a população vai ter.”
Do “Bafafá” à Câmara:
uma rotina dupla
As tardes de Jorge Araújo ganharam um novo compromisso na Câmara Municipal desde janeiro, mas, entre 12h50 e 13h15 de segunda a sexta-feira, o encontro ainda é na Band Bahia. Em novembro de 2024, estreou o programa Bafafá na Band, que hoje Jorge concilia com o mandato.
Em outubro de 2025, um ano após a primeira entrevista, nos encontramos novamente com Jorge Araújo. A conversa é rápida, entre um compromisso e outro do apresentador. Perguntado se existe algum tipo de choque com o partido quando faz ao vivo cobranças à prefeitura – uma vez que seu partido é da base do prefeito –, ele garante que não.
Não é proibido manter as duas profissões: a Constituição Federal estabelece que existe a possibilidade de um vereador assumir ou manter outro emprego, contanto que não haja conflito de horários e atividades. Na prática, porém, justamente por serem áreas que costumam se encontrar, pode haver rusgas entre as ocupações. É o que defende Paulo Victor Melo.
“Nós temos que entender que a comunicação extrapola as questões legais. É um campo com uma capacidade substancial de influenciar opiniões, de formar ideias, de moldar valores, de estimular comportamentos e práticas, que são os meios de comunicação. Claro que o componente do que é permitido ou não tem que ser avaliado, mas me parece extremamente prejudicial para o jornalismo e para a política e, portanto, para a democracia, que um parlamentar tenha um programa de rádio ou seja repórter de um programa. Porque isso prejudica tudo: a credibilidade da informação, a cobertura sobre o parlamento e o nível de aprofundamento da informação que a população vai ter.”
“Não é tudo que Bruno [Reis, prefeito de Salvador] faz que eu digo amém. Existem algumas coisas que ele faz que eu não concordo. O que eu acho bacana é que eu consigo dividir as tarefas. Uma coisa é uma coisa e outra coisa é outra coisa, eu não costumo misturar. E não uso a comunicação para me favorecer politicamente”, afirma Araújo.
Menos microfones nas urnas
O cenário se repetiu na campanha de Anna Valéria. A jornalista, que foi repórter da TV Bahia por mais de 30 anos, foi candidata a deputada federal em 2022 e a vereadora em 2024, ambas pelo PP. Segundo ela, a candidatura veio depois de pedidos de moradores de uma comunidade com a qual trabalhava. O que lhe deu o gás necessário foi, em suas palavras, “o mesmo que me motivou no jornalismo: gostar de gente”. “O que me motiva não é a ideologia, é a possibilidade de um mandato para realizar”, define.
Quando decidiu entrar na disputa, já era filiada ao Partido Progressista, então resolveu apostar. "O PP foi o primeiro que viu em mim o potencial de fazer alguma coisa. Não porque é de centrão, de esquerda, de direita. É porque foi o único que viu isso em mim e me abriu essa possibilidade sabendo que eu não tinha nenhuma experiência. Eu não queria entrar na política, até que um dia Bruno Reis me chamou na sala dele e eu já sabia para que era, tentar me fisgar. E foi uma armadilha, porque ele é muito convincente”, diz.
Não obteve o número necessário de votos em nenhuma das tentativas. No pleito mais recente, foram 2.725 votos, que a deixaram na posição de suplente. À derrota, atribui falta de investimento e de apoio de líderes comunitários, o que considera essencial numa campanha. O apoio que teve, afirma, foi o do prefeito reeleito e de membros do próprio partido. Hoje, quando ouve as pessoas chamarem-na de “minha vereadora”, a resposta é uma só:
"’Que p*rra de vereadora, não sou vereadora de lugar nenhum. Ninguém me quis!’”, brinca. “O povo fica me cobrando. Eu digo: ‘mas não adianta, porque eu não vou ser eleita pela classe A’. 80% dos meus votos foram na classe A. Sabe por quê? Porque é o voto que o partido chama de voto de opinião. É aquele voto de quem realmente tem o conceito da política, de quem quer mudança, de quem quer trabalho e que confia, porque tem 40 anos que eu mostrei quem eu sou e o que eu sou. Eu não roubei PIX das pessoas. Agora, se o que roubou o PIX se candidatar, vai para deputado federal”, desabafa.
Refletindo que a visibilidade não significa conversão em votos, tem acontecido nos últimos anos uma queda de candidaturas de jornalistas, locutores e radialistas. No último pleito municipal, houve um declínio de 30% no número de comunicadores em relação a 2020, apontam as estatísticas eleitorais do TSE.

Para Paulo Victor Melo, essa redução pode estar relacionada a alguns pontos importantes: o fato de governos autoritários colocarem a prática jornalística como um alvo e a perda de confiança no jornalismo, decorrente também dos ataques aos profissionais e à proliferação crescente de conteúdos falsos e desinformação.
De acordo com o Relatório da Violência Contra Jornalistas e Liberdade de Imprensa no Brasil de 2022, desenvolvido pela Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj), naquele ano foram registrados 376 ataques a jornalistas e veículos de imprensa, e 104 foram cometidos pelo então presidente Jair Bolsonaro.
“De um modo geral, há uma crescente desconfiança com o jornalismo, que é potencializada por uma crença nos líderes religiosos, nos influencers digitais, etc. E isso resulta também numa maior dificuldade dos jornalistas que se candidatam em conquistar votos”, afirma.
Apesar dos desafios, uma coisa certa é que a presença de repórteres e apresentadores nas urnas está longe de ter fim. Pelo menos no que depender de Jorge Araújo. Agora, para ele, o objetivo é levar “bafafá, confusão, fofocagem e agonia” para a Câmara dos Deputados.
Menos microfones nas urnas
O cenário se repetiu na campanha de Anna Valéria. A jornalista, que foi repórter da TV Bahia por mais de 30 anos, foi candidata a deputada federal em 2022 e a vereadora em 2024, ambas pelo PP. Segundo ela, a candidatura veio depois de pedidos de moradores de uma comunidade com a qual trabalhava. O que lhe deu o gás necessário foi, em suas palavras, “o mesmo que me motivou no jornalismo: gostar de gente”. “O que me motiva não é a ideologia, é a possibilidade de um mandato para realizar”, define.
Quando decidiu entrar na disputa, já era filiada ao Partido Progressista, então resolveu apostar. "O PP foi o primeiro que viu em mim o potencial de fazer alguma coisa. Não porque é de centrão, de esquerda, de direita. É porque foi o único que viu isso em mim e me abriu essa possibilidade sabendo que eu não tinha nenhuma experiência. Eu não queria entrar na política, até que um dia Bruno Reis me chamou na sala dele e eu já sabia para que era, tentar me fisgar. E foi uma armadilha, porque ele é muito convincente”, diz.
Não obteve o número necessário de votos em nenhuma das tentativas. No pleito mais recente, foram 2.725 votos, que a deixaram na posição de suplente. À derrota, atribui falta de investimento e de apoio de líderes comunitários, o que considera essencial numa campanha. O apoio que teve, afirma, foi o do prefeito reeleito e de membros do próprio partido. Hoje, quando ouve as pessoas chamarem-na de “minha vereadora”, a resposta é uma só:
"’Que p*rra de vereadora, não sou vereadora de lugar nenhum. Ninguém me quis!’”, brinca. “O povo fica me cobrando. Eu digo: ‘mas não adianta, porque eu não vou ser eleita pela classe A’. 80% dos meus votos foram na classe A. Sabe por quê? Porque é o voto que o partido chama de voto de opinião. É aquele voto de quem realmente tem o conceito da política, de quem quer mudança, de quem quer trabalho e que confia, porque tem 40 anos que eu mostrei quem eu sou e o que eu sou. Eu não roubei PIX das pessoas. Agora, se o que roubou o PIX se candidatar, vai para deputado federal”, desabafa.
Refletindo que a visibilidade não significa conversão em votos, tem acontecido nos últimos anos uma queda de candidaturas de jornalistas, locutores e radialistas. No último pleito municipal, houve um declínio de 30% no número de comunicadores em relação a 2020, apontam as estatísticas eleitorais do TSE.
Para Paulo Victor Melo, essa redução pode estar relacionada a alguns pontos importantes: o fato de governos autoritários colocarem a prática jornalística como um alvo e a perda de confiança no jornalismo, decorrente também dos ataques aos profissionais e à proliferação crescente de conteúdos falsos e desinformação.
De acordo com o Relatório da Violência Contra Jornalistas e Liberdade de Imprensa no Brasil de 2022, desenvolvido pela Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj), naquele ano foram registrados 376 ataques a jornalistas e veículos de imprensa, e 104 foram cometidos pelo então presidente Jair Bolsonaro.
“De um modo geral, há uma crescente desconfiança com o jornalismo, que é potencializada por uma crença nos líderes religiosos, nos influencers digitais, etc. E isso resulta também numa maior dificuldade dos jornalistas que se candidatam em conquistar votos”, afirma.
Apesar dos desafios, uma coisa certa é que a presença de repórteres e apresentadores nas urnas está longe de ter fim. Pelo menos no que depender de Jorge Araújo. Agora, para ele, o objetivo é levar “bafafá, confusão, fofocagem e agonia” para a Câmara dos Deputados.

Visibilidade garante votos?
Apesar da proximidade, a audiência não significa necessariamente uma votação expressiva, e as tentativas de transferir as bandeiras do jornalismo para as urnas nem sempre têm sucesso, e às vezes batem na trave.
Uziel Bueno que o diga. Apresentador do Brasil Urgente Bahia, um dos principais programas policialescos do estado, Uziel tem um longo histórico de eleições: concorreu a deputado estadual em 2010, pelo partido PTN e novamente em 2014, pelo PV; em 2016, foi candidato a vereador pelo PTN, e em 2020 pelo DEM. Em todos os pleitos foi suplente, e chegou a atuar como deputado entre dezembro de 2012 e julho de 2013 e como vereador entre abril e agosto de 2018.
“Quando eu saí da TV Aratu, antes de vir para a Band, eu fiquei um pouco órfão. E aí eu vi que dava para ir para a política e fazer alguma coisa lá. Pensei: ‘dá para ter voz na política, já que eu sou uma pessoa muito popular, que fala a língua do povo e reflete os anseios do povo’”, relembra Uziel.
Sem familiares ricos, políticos ou jornalistas, como ele mesmo diz, Uziel se considera vitorioso na política por ter desbravado esse caminho. “Só de ter ficado lá um tempo, de contribuir de alguma forma, já estou muito satisfeito”, diz.
A sopa de letrinhas política que fez ao longo das candidaturas foi natural para ele, que afirma que “partido político é apenas uma sigla”. O apresentador diz discordar da noção de que o partido reflete a ideologia do candidato, e conta que foi para o PTN (atual Podemos) a convite de João Carlos Bacelar, então presidente do partido, e migrou para o PV nas eleições seguintes por ser uma opção mais progressista, com a característica de defender o verde e mais espaço de penetração no partido.
“Para mim, por mais que eles falem que têm uma ideologia A ou B, que são de direita, esquerda ou centro, quando estão lá dentro do parlamento eles se fecham e querem que os privilégios sejam mantidos para todos. A briga fica mais na questão de mídia e fora do plenário. Na prática mesmo, não tem muita diferença o partido político. Eles só brigam pelo poder”, defende.
Entre os jornalistas entrevistados, esse é um ponto comum: a minimização do partido político na equação do pleito – a sigla aparece como um detalhe que pode viabilizar o acesso à Câmara. Para Paulo Victor Melo, essa concepção acende um sinal vermelho.
“O partido importa, sim, porque ele também tem uma história. Então, qual é a história do partido A ou do partido B ou C quando o assunto é tal tema? Porque senão, cai-se logo no senso comum de que ‘é tudo a mesma porcaria e o que importa são as pessoas’. Não, o que importa não são as pessoas, tanto que são as pessoas que formam os partidos”, afirma o especialista.
Visibilidade garante votos?
Apesar da proximidade, a audiência não significa necessariamente uma votação expressiva, e as tentativas de transferir as bandeiras do jornalismo para as urnas nem sempre têm sucesso, e às vezes batem na trave.
Uziel Bueno que o diga. Apresentador do Brasil Urgente Bahia, um dos principais programas policialescos do estado, Uziel tem um longo histórico de eleições: concorreu a deputado estadual em 2010, pelo partido PTN e novamente em 2014, pelo PV; em 2016, foi candidato a vereador pelo PTN, e em 2020 pelo DEM. Em todos os pleitos foi suplente, e chegou a atuar como deputado entre dezembro de 2012 e julho de 2013 e como vereador entre abril e agosto de 2018.
“Quando eu saí da TV Aratu, antes de vir para a Band, eu fiquei um pouco órfão. E aí eu vi que dava para ir para a política e fazer alguma coisa lá. Pensei: ‘dá para ter voz na política, já que eu sou uma pessoa muito popular, que fala a língua do povo e reflete os anseios do povo’”, relembra Uziel.
“Para mim, por mais que eles falem que têm uma ideologia A ou B, que são de direita, esquerda ou centro, quando estão lá dentro do parlamento eles se fecham e querem que os privilégios sejam mantidos para todos. A briga fica mais na questão de mídia e fora do plenário. Na prática mesmo, não tem muita diferença o partido político. Eles só brigam pelo poder”, defende.
Entre os jornalistas entrevistados, esse é um ponto comum: a minimização do partido político na equação do pleito – a sigla aparece como um detalhe que pode viabilizar o acesso à Câmara. Para Paulo Victor Melo, essa concepção acende um sinal vermelho.
“O partido importa, sim, porque ele também tem uma história. Então, qual é a história do partido A ou do partido B ou C quando o assunto é tal tema? Porque senão, cai-se logo no senso comum de que ‘é tudo a mesma porcaria e o que importa são as pessoas’. Não, o que importa não são as pessoas, tanto que são as pessoas que formam os partidos”, afirma o especialista.
Sem familiares ricos, políticos ou jornalistas, como ele mesmo diz, Uziel se considera vitorioso na política por ter desbravado esse caminho. “Só de ter ficado lá um tempo, de contribuir de alguma forma, já estou muito satisfeito”, diz.
A sopa de letrinhas política que fez ao longo das candidaturas foi natural para ele, que afirma que “partido político é apenas uma sigla”. O apresentador diz discordar da noção de que o partido reflete a ideologia do candidato, e conta que foi para o PTN (atual Podemos) a convite de João Carlos Bacelar, então presidente do partido, e migrou para o PV nas eleições seguintes por ser uma opção mais progressista, com a característica de defender o verde e mais espaço de penetração no partido.












